No fórum “Ética e Políticas Públicas de Saúde”, realizado sexta-feira passada (22/9), em Brasília, especialistas apresentaram propostas para um novo modelo de assistência em saúde mental no país. As propostas serão votadas no Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em outubro, e encaminhadas ao Ministério da Saúde. O fórum fez parte do “3º Simpósio Internacional sobre Depressão e Transtorno Bipolar”, em que psiquiatras brasileiros e associações ligadas à defesa dos portadores de transtornos mentais questionaram o processo de reforma no atendimento. A saúde mental merece também atenção especial de pastores e líderes de igrejas, que devem buscar compreender melhor o problema. Segundo o Ministério da Saúde, os transtornos mentais nos brasileiros estão acima dos níveis esperados: “A esquizofrenia atinge 1% da população, por exemplo. Os transtornos graves – psicóticos, somados à esquizofrenia – alcançam 3%; os distúrbios gerados pela dependência de álcool, 10% da população acima de 12 anos. Então, a magnitude do problema exige grande disponibilidade de serviços. A crise social e a violência urbana afetam a saúde mental das pessoas”.
Entre as propostas do fórum de psiquiatras para a melhoria do sistema estão a criação de uma rede diversificada de atendimento, com ambulatórios, hospitais especializados, unidades psiquiátricas em hospitais gerais, moradias supervisionadas e programas de reabilitação. Para a formulação do modelo, a Associação Brasileira de Psiquiatria designou um grupo de 12 profissionais. Os psiquiatras brasileiros e as associações ligadas à defesa dos portadores de transtornos mentais questionaram o processo de Reforma do Modelo de Assistência em Saúde Mental, conhecida como reforma psiquiátrica, que define a reinserção social e assistência integral ao paciente. E que, além disso, prevê que a internação em hospital seja o último recurso no tratamento de doenças mentais (lei promulgada em 2001). Os especialistas criticam a forma como a legislação é cumprida. Alegam que os recursos não estão sendo bem aplicados, o que acaba deixando os pacientes sem alternativas de tratamento. De acordo com o presidente da Associação Psiquiátrica de Brasília (APBr), Antônio Geraldo da Silva, o país passa por uma falta de assistência na área. “O pronto-socorro comum não está preparado para atender doentes mentais. Discordo de como é conduzida a reforma do modelo de assistência em saúde mental. Tem que ser integral, com vários tipos de serviço como campanhas e programas específicos”, aponta. Segundo Silva, havia 120 mil leitos públicos no país em 1989. Com a implantação da reforma, foram reduzidos a 40 mil. “Não criaram alternativas para o tratamento dessas pessoas. A proposta era fazer no mínimo 3.500 serviços de atendimento em psiquiatria e foram feitos 880. Isso não é nada, não atende nem o estado de Minas Gerais, que tem 852 municípios. Então, a saúde mental no país está muito aquém da necessidade da população”, avalia. Segundo o professor do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo e diretor de psiquiatria do Hospital das Clínicas, Valentim Gentil, com a extinção de leitos de hospitais psiquiátricos, desde a promulgação da lei 10.216, em 2001, alguns pacientes que saem desses leitos passam a viver nas ruas ou acabam presos. Gilson Magalhães, da Associação de Familiares de Doentes Mentais da Bahia, participou do evento e concorda com Gentil. Segundo ele, 520 leitos psiquiátricos foram extintos na Bahia, de janeiro a junho de 2006. “Das pessoas que ocupavam esses leitos, 16 foram instaladas em uma residência terapêutica. As outras 504 saíram dos hospitais e não sabemos onde estão. Inclusive, 62 não tinham qualquer referência familiar”. A representante do Grupo de Familiares de Doentes Mentais do Rio de Janeiro, Ligia Nogueira Moreno, disse que as famílias precisam recorrer à Justiça para conseguir internações de emergência. “A pessoa é levada ao hospital, toma uma injeção e é mandada para casa, mas a crise continua. Precisamos recorrer a um juiz de plantão, que ordena a internação. E quando não há família?”, questiona. “O modelo no qual o Brasil se inspirou, que é a reforma psiquiátrica italiana, deu ao paciente alternativas de tratamento antes de retirar dele o leito”, afirma Gentil. “Temos hoje pelo menos dez pessoas amarradas em macas ou que estão em camas ou no chão de hospitais do município de São Paulo. A prefeitura informou que, no fim de agosto, 268 pessoas tiveram a internação inviabilizada por falta de leito”, completa. Os participantes do fórum defendem a ampliação do sistema de atendimento. No Brasil, existem 27 Caps que funcionam 24 horas. Cada um tem cinco leitos e as internações não podem ultrapassar uma semana. “Não queremos o retorno daquele modelo medieval de hospital. Todos acreditamos que a internação é o último recurso, mas ela pode ser necessária em um tratamento”, diz o psiquiatra. O Ministério da Saúde negou piora na assistência à saúde mental. O coordenador-geral da área destacou os dados do Ministério: em 916 centros do país são atendidas 450 mil pessoas – em 2000 eram 170 Centros. A rede de assistência mantida pelo ministério inclui 400 ambulatórios e 490 residências terapêuticas monitoradas (casas onde vivem pacientes que perderam vínculos familiares). Fonte: Agência Brasil
Atualizada: Domingo, 07 Novembro 2010 23:33