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Favela: um lugar (quase) perfeito

A quem conhece minimamente a realidade habitacional da população pobre do Rio, não surpreende a pesquisa recente que registra a disposição maciça dos moradores de favelas em continuar residindo nelas, repelindo uma mudança que em alguns aspectos poderia até mesmo ser tida como vantajosa para eles.

Antes de entrar no mérito da questão, é sempre necessário e justo reconhecer que favela é a solução que, nascida ou não na cidade, uma expressiva parcela de seus habitantes encontrou por si mesma para o problema da moradia. Não cumprindo o preceito constitucional de garantir na prática o direito de todos à habitação digna, o estado não deixa opção aos prejudicados. Na economia informal funciona o mesmo princípio.

Razões do coração

Na realidade, os imigrantes que, saindo de seus estados, viram que o eldorado ficava no Rio, mas só em algumas áreas da cidade, gostariam mesmo é de nunca terem saído de sua terra natal. É só perguntar a qualquer mineiro, capixaba ou nordestino em que lugar mora seu coração. Certamente que a resposta dificilmente seria "na favela". Nem mesmo "em outro lugar desta cidade". Não se consegue descartar de todo, porém, a hipótese afetiva: quem mora em favela acaba gostando de morar em favela, mesmo porque muitos nasceram lá. Mais: muitos fundaram a comunidade, ou são descendentes diretos de seus criadores. Não há somente razões pragmáticas para a decisão de ficar.

O fato é que ali, na comunidade, é que estão o lar, os amigos, a igreja, os encontros, os assuntos, as experiências, os lugares e, nos casos específicos, o sustento e a prosperidade. É também lá que funciona quase à perfeição a lei não escrita – na realidade, muito útil à pessoa humana em geral - no sentido de ver, ouvir e saber tudo, falar apenas o necessário e o suficiente e cuidar cada um de sua própria vida, só se envolvendo com a alheia por legítima defesa e para prestar solidariedade.

Na favela, sobrevive ainda, em inúmeros casos, o modelo patriarcal de família: em uma mesma residência, andar sobre andar, moram os avós, os filhos e os netos. Os bisnetos chegam rápido, pela gravidez precoce. Os membros das gerações mais antigas gostam de usar o bordão "nascido e criado aqui". Como sair, quando sua vida toda, para o bem ou para o mal, se passou lá dentro? Para os referidos imigrantes fica mais fácil sair, porque suas raízes estão longe. Mesmo eles, contudo, com o tempo, acabam por ter um sentimento de simpatia para com a comunidade. Se não têm, deveriam ter, pois foi ela que os acolheu, apesar de tudo.

Razões comparadas

No mais, ficar é uma questão de puro bom senso. Em geral, o local de trabalho não fica absurdamente distante, como em outros casos. Empregadas domésticas da Zona Sul, da favela da Rocinha, por exemplo, ou vão a pé para o trabalho ou não levam meia hora para chegar de condução a ele. O custo de vida, no geral, acaba sendo muito inferior ao do bairro, vítima de impostos e taxas que, no final, é o dinheiro que financia os péssimos serviços mal prestados pelo estado a todos, favelados ou não. Existem favelas cujas moradias são amplas, arejadas e confortáveis. Em casos especiais, com vista deslumbrante da cidade lá embaixo.

Nem é preciso falar de apartamentos tipo 3x4 onde se comprimem mais moradores do que em celas de penitenciária brasileira. A rede comercial de algumas favelas do Rio rivaliza com a de muitos bairros de peso. As crianças, ainda muito pequenas, vão a pé sozinhas para as escolas, em geral muito próximas de onde moram. O índice de pequenos delitos nas favelas é ínfimo - com ou sem crime organizado, com ou sem UPP. Quem furta, rouba, assalta ou sequestra não faz isso no lugar onde mora.

Como nem tudo é perfeito, o "quase" do título fica por conta da falta de saneamento básico em muitas favelas, da ocupação de áreas de risco por outras tantas e pelo mal maior do narcotráfico mandando e desmandando nas áreas de onde ainda não foi expulso. Talvez por isso, expressões como "Favela Wars" (jogo eletrônico, em baixa quando este artigo foi escrito, em junho de 2014), "Favela Sinistra" (título de música) e Taça das Favelas (campeonato de futebol entre times de comunidades, promovido pela Central Única das Favelas - CUFA) estão na boca do povo. Há também o mal da ausência de aspectos que configuram a cidadania plena, a começar pelo título de propriedade da moradia. E há o preconceito, calcado na ignorância, como é sempre o caso, que tende a depreciar o favelado em relação ao morador do bairro. Tanto é que, para finalizar, nunca é demais entoar o velho, cansativo e falacioso refrão no sentido de que a maioria dos moradores de favelas é formada de gente honesta e trabalhadora.

Nos demais bairros da cidade também. (Por Macéias Nunes)

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Atualizada: Quarta, 18 Abril 2018 11:21